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O Efeito Cobra: suas metas estão jogando contra você?
Sempre batemos na tecla da importância das metas em uma empresa, mas será que você está fazendo isso da forma correta?
Metas e incentivos são importantes. Estabelecer metas e criar sistemas de incentivo funciona muito bem e é por isso que as organizações usam essas ferramentas. Afinal, elas são as responsáveis por fazer com que as pessoas se comportem de determinado modo.
Mas, não se engane, por mais que a definição de metas seja algo essencial, é preciso ter muito cuidado durante o processo, pois quando elas não são bem estruturadas, as consequências podem ser ruins para o negócio.
No paper Goals Gone Wild, publicado pela Universidade de Harvard, os autores recomendam que “gerentes e acadêmicos devem entender a definição de metas como medicação que requer dosagem cuidadosa, consideração dos efeitos colaterais e supervisão próxima.”
Precisamos evitar os efeitos colaterais das metas, os chamados incentivos perversos, responsáveis por produzirem resultados não-intencionais e indesejáveis. São aqueles famosos “tiros no pé” do sistema de metas. Os incentivos perversos também podem ser chamados de “Efeito Cobra”, devido a um caso que ocorreu na Índia colonial. O caso não é historicamente preciso, mas ajuda a entender um conceito-chave:
Durante o domínio colonial britânico, havia muitas cobras venenosas em Déli, então o governo decidiu criar um programa para incentivar a população a matar as cobras. O programa era simples: traga uma cobra morta e pegue uma recompensa. Semana após semana, o governo pagava somas de dinheiro cada vez maiores conforme mais e mais cobras mortas eram entregues.
Tudo ia bem, até que um dia um oficial britânico foi ao interior e descobriu que a população estava criando cobras, já que era uma atividade mais rentável do que criar ou plantar qualquer outra coisa. O que você faria se fosse o governante britânico depois de descobrir os criadores de cobras?
Quando pergunto isso em meus workshops sobre OKR, a maioria dos participantes diz que eles cancelariam o programa e parariam de pagar a recompensa. E foi exatamente o que o governo britânico fez. E o que a população fez? Soltou todas as cobras. O resultado foi uma população muito maior de cobras depois do governo ter gasto grandes quantias de dinheiro em seu combate.
Mais que uma história divertida, esse caso explica um conceito muito importante. Estamos cercados por incentivos perversos e efeitos cobra:
- Times de vendas com metas trimestrais agressivas oferecem grandes descontos no fim do trimestre para atingir sua cota. Clientes sabem disso e então esperam até o fim do trimestre para conseguir uma pechincha;
- Gerentes que tentam gastar o excedente de orçamento no fim do ano – mesmo com projetos que não são prioritários – para evitar a redução no orçamento do próximo ano;
- Médicos e hospitais que optam pela cesariana por ser um procedimento mais rápido e agendável, fazendo com que 84% dos nascimentos na rede privada de saúde no Brasil sejam cesáreas contra os 15% recomendados pela OMS.
É muito importante entender que incentivos perversos não são apenas uma questão de pessoas agindo de má-fé. Seu time pode simplesmente estar tentando atingir as metas estabelecidas, sem um completo entendimento dos objetivos organizacionais. Assim, é uma responsabilidade direta dos gestores assegurar que todas as metas são claras e sustentáveis, evitando incentivos perversos. Metas não chegam a ser uma medicação “tarja preta” mas não devem ser vistos como vitamina C.
Mas, então, como você evita incentivos perversos? Balanceando metas.
Andy Grove, ex-CEO da Intel, tem um ótimo conselho para lidar com eles: “Para cada métrica, deve existir outra métrica paralela que lida com as consequências adversas da primeira.”
Ou seja, cada métrica deve ser “pareada” ou balanceada com outra, para evitar incentivos perversos. As empresas que utilizam OKR (Objectives and Key Results) sabem que nessa metodologia cada objetivo tem um conjunto de 2 a 5 Key Results (métricas). Por que não podemos ter somente uma métrica por objetivo?
Em OKR um objetivo tem vários Key Results para balanceá-los. Ter vários Key Results nos permite evitar os incentivos perversos, por meio de um OKR que é saudável e sustentável. Se você ainda não conseguiu visualizar isso na prática, vamos a um exemplo:
Imagine que seu objetivo sejaencantar os clientes da sua empresa. Como Key Results, você poderia ter:
- Aumentar a média semanal de visitas no site para 3,3 por usuário ativo;
- Aumentar o tráfego orgânico (não pago) para 80%;
- Atingir um Net Promoter Score de 52%;
- Reduzir o churn de receita para 1%;
- Aumentar o engajamento (usuários que preenchem o perfil todo) para 75%.
Agora, vamos ao passo 2: avaliar como esses Key Results se balanceiam.
Sozinho, o primeiro Key Result - aumentar visitas – poderia ser atingido gastando muito dinheiro em marketing, mas isso é balanceado pelo segundo Key Result – aumentar tráfego orgânico. Aumentar as visitas poderia reduzir o engajamento, fazendo com que os clientes ficassem poucos segundos no site, mas o último Key Result evita isso. Por último, aumentar o NPS e reduzir o churn assegura que estamos focando em clientes felizes e leais.
Você pode balancear os Key Results dentro do mesmo OKR ou entre diferentes OKRs. Dois OKRs distintos, cada um com um objetivo e um conjunto de Key Results, podem se balancear. Mesmo as empresas que não utilizam OKR podem usar um balanceamento para terem metas saudáveis.
Como regra geral, você deveria equilibrar métricas de eficiência – entregar no prazo – com métricas de qualidade – menos bugs no produto.Uma meta de vendas poderia ser balanceada ao incluir margem, satisfação do cliente e redução de inadimplência. E por aí vai.
Como dito no começo do texto, metas são importantes, mas os empreendedores devem sempre dar uma atenção redobrada na hora de estabelecer os critérios. Lembre-se semrpre: balancear, em muitos casos, é a solução.