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O juro está alto? Faça o dinheiro crescer e boas compras
Pagar primeiro e levar depois pode ser uma boa alternativa em época de ajustes na economia. Veja como colocar em prática a mágica dos juros no seu bolso
Leve agora e pague depois. Se a prestação cabe no bolso, qual o problema? Nenhum, considerando que isso ainda gera uma satisfação enorme. Mas já parou para pensar no oposto dessa relação, no pague agora e compre depois?
É difícil fazer isso quando o bem apresenta um preço alto, como um imóvel, por exemplo. Mas para aquele celular ou TV de última geração ou mesmo para uma viagem de férias é possível sim e com um esforço que não é necessariamente hercúleo.
Simulação de Mauro Calil, especialista em investimentos do banco Ourinvest, mostra o quanto o valor da parcela de alguns bens e serviços pode crescer em aplicações de renda fixa, o chamado autofinanciamento.
Basicamente, é preciso ter disciplina para “pagar” a prestação a si mesmo. E, acima de tudo, controlar as emoções, que estão sempre ali, cutucando as decisões financeiras.
“Pergunte a si mesmo se precisa consumir agora, porque esta é uma questão emocional, principalmente para quem vai casar ou ter filhos. Por causa da emoção, a tendência é pensar rapidamente que a parcela cabeno bolso sim. Neste ano, será preciso fazer a razão ficar mais forte e buscar sempre uma boa negociação de preços”, diz Ricardo Pereira, consultor do programa Consumidor Consciente, da Mastercard.
Em época de juros altos, é preciso buscar oportunidades para fazer o dinheiro crescer e realizar os desejos de consumo, uma alternativa melhor do que pagar as taxas altas do crédito.
A taxa média de juros para a aquisição de automóveis, segundo balanço do Banco Central do mês de dezembro, é de 22,3% ao ano ou 1,69% por mês. Já para a aquisição de outros bens, de 82,3% ao ano, ou 5,13% ao mês. Para se ter uma ideia, o que se paga em juros é menos do que se ganha em aplicações de renda fixa, ou seja, em torno de 1% ao mês.
O momento mais propício para consumidores e empresários criarem um colchão financeiro é agora, quando a economia passa por ajustes representados por corte de gastos do governo, aumento de impostos e elevação das taxas de juros para controlar a inflação e de impostos.
A inflação oficial medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) foi de 1,24% em janeiro. No acumulado em 12 meses até o último mês, atingiu 7,14%.
O índice está sendo pressionado pelo aumento de preços de energia, transportes e combustíveis. E tem sido um dos fatores de desequilíbrio no orçamento doméstico.
Com a renda comprometida pela inflação, o consumidor já não compra tanto quanto antes. É o que mostram os dados daAssociação Comercial de São Paulo (ACSP). No acumulado de 12 meses até janeiro, as vendas à vista caíram 3,2%, enquanto o indicador a prazo mostra uma redução de 3,9%.
Esse ambiente de aperto na economia está apenas começando. “O melhor que todos têm a fazer é organizar suas finanças pessoais e formar uma boa reserva financeira para enfrentar esse período”, diz Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi (Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento).
Um dos sinais de que o orçamento das famílias está mais limitado, o que amplia a dificuldade de guardar dinheiro, está na diferença entre depósitos e saques da caderneta de poupança em janeiro.
As pessoas estão recorrendo mais aos recursos poupados por causa do aperto na economia. Em janeiro, houve mais retiradas, no valor de R$ 153 bilhões, do que os depósitos na caderneta, que somaram apenas R$ 147,47 bilhões.
PLANEJAR PARA CONSUMIR
Jansen Costa, planejador financeiro com certificação CFP (Certified Financial Planner), diz que, independentemente do cenário na economia, poupar tem de ser um hábito.
“É bom lembrar que os sonhos podem ser realizados com recursos próprios ou por meio de dívidas. O problema da segunda opção é que os juros são altos e alguns bens financiados se desvalorizam ao longo do tempo, como o automóvel”, explica.
O que vale financiar no banco é o ativo que se valoriza ao longo do tempo, como o imóvel. No entanto, é preciso fazer uma boa pesquisa das taxas de juros dos bancos.
O parcelamento de outros bens também exige essa pesquisa. E mais do que isso: a tarefa de descobrir se o valor da prestação se encaixa no orçamento e não necessariamente no bolso.
Para fazer isso, é preciso saber qual é a renda líquida (livre de impostos e contribuições) e descontar dela as despesas fixas. Depois, com esse saldo em mãos, extrair todas as prestações em andamento, seja de cartão ou crediário.
“O problema é que as pessoas olham para o valor da prestação e não para o do bem. Paga um eletrodoméstico em 36 vezes e não sabe que, com o valor final, daria para comprar até dois”, diz Costa.
Calil, do banco Ourinvest, sugere o autofinanciamento para quem não tem urgência para comprar um carro ou um eletrodoméstico. “Quem tem esse tempo deve informar-se sobre o valor da parcela e aplicar essa quantia pelo mesmo período”, diz.
O especialista fez uma simulação que mostra diferentes situações de autofinanciamento de produtos de maior valor e prazo de pagamento, como um carro, e de fluxos menores, como uma viagem de férias e um eletrodoméstico.
Para cada situação, ele mostra quanto o valor da parcela de cada bem pode crescer se for aplicado na renda fixa, no mesmo prazo proposto pelo financiamento.
A aplicação na renda fixa permite liquidez e um rendimento determinado por um percentual do CDI (Certificado de Depósito Interbancário, taxa praticada entre bancos). É uma taxa acompanha a Selic, hoje em 12,25% ao ano.
Para quem pode se autofinanciar por dois anos ou mais, uma alternativa é considerar a compra do título Letras Financeiras do Tesouro (LFT), que paga a taxa Selic cheia do período.
No entanto, sobre os rendimentos desse título incide Imposto de Renda (IR) de forma regressiva, ou seja, diminui quanto maior for o prazo de resgate.
Outras opções são as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), que também pagam um percentual do CDI (Certificado de Depósito Interbancário) e são isentas de IR.
Calil também simulou o quanto o dinheiro pode crescer em CDBs (Certificados de Depósito Bancário) e Letras de Câmbio, estas com incidência de IR.
O ideal é que o prazo de acumulação do dinheiro na aplicação seja maior nas aplicações sobre as quais incide o IR, para evitar o pagamento de uma alíquota mais alta de imposto.
Para quem não tem acesso a essas aplicações, o especialista simulou o quanto as prestações cresceriam em depósitos regulares na caderneta de poupança.
Para se ter uma ideia, a prestação de um automóvel guardada pelo prazo máximo de financiamento - 60 meses (ou cinco anos) - permite comprar um melhor à vista, se o dinheiro for guardado em uma boa aplicação de renda fixa.
“Lá na frente, a pessoa vai ver que pode comprar até um carro melhor e com mais acessórios. Ou, melhor, no meio do caminho ela já terá dinheiro para comprar o automóvel desejado, já que o prazo de cinco anos é longo”, diz Calil.
Ele diz que esperar para consumir é bom não só porque o dinheiro guardado cresce com os juros, mas também porque o preço de alguns bens muda com o passar do tempo.
Assim, a TV que, hoje, custa um determinado valor, em um prazo de seis meses poderá valer menos por causa da entrada de modelos modernos no mercado.
E isso é mais uma amostra de que pode se esperar muito ou nem tanto para conseguir realizar desejos de consumo com o autofinanciamento.
Com a viagem de férias em família, em hotel cinco estrelas, também é possível fazer um planejamento.
“O que acontece muito é que as pessoas viajam primeiro e pagam depois. E, nesse ciclo, precisam terminar de pagar para viajar de novo. Para invertê-lo, será preciso esperar uns seis meses, guardar dinheiro e tirar férias de novo”, diz.
“Essa fórmula funciona para muitos bens, mas não para imóveis. Se a pessoa guardar dinheiro para comprar lá na frente, a casa pode ter se valorizado muito. Em oito ou dez anos pode ter acontecido muita mudança na região do imóvel”, conclui Calil.